EdUEMG

A cultura do “sampling” e a perspectiva histórica nos estudos musicais

Por: Sofia Santos*

 

post diferentes registros musicais

 

O mês de abril de 2024 trouxe um novo burburinho nas redes sociais e nas páginas especializadas em música. Foi noticiado que o novo álbum da artista americana Beyoncé contém faixas que homenageiam algumas músicas tradicionais em língua inglesa e até mesmo há o trecho de uma canção brasileira. Um dos casos é a regravação da canção Jolene, que surgiu em 1973 na voz da cantora Dolly Parton. Além disso, no novo trabalho Beyoncé “sampleou” os Beatles em uma versão que fez da música Blackbird. No caso da canção de origem nacional, foi feito um sample de Aquecimento das Danadas, de autoria dos DJs O Mandrake e Xaropinho, dentro da canção SPAGHETTII. Esses fatos, que mereceram tanto destaque na mídia, mostram como a música permite uma flexibilidade de releituras em diferentes épocas e, também, a importância dos registros.

 

Em uma perspectiva local, em Belo Horizonte vários beatmakers tradicionais se destacaram no início deste século com o uso da técnica de sampling em músicas desenvolvidas pelos rappers da cidade. Não foram poucas as músicas que serviram de base para as criações de beatmakers e MCs, com inspirações de diversos locais, épocas e estilos, mostrando a versatilidade dessa prática artística em criar novas obras a partir do que veio antes. Embora a discussão sobre direitos autorais esteja sempre presente em uma espécie de embate entre artistas e seus admiradores, todo esse cenário colaborou para criar em Belo Horizonte uma cena de destaque do rap nacional, que se confirma, por exemplo, na existência do Duelo de MCs, movimento de cultura urbana e resistência que fortalece continuamente a cena hip-hop da cidade.

Indo por outro caminho, há mais e enriquecedoras formas de trazer para o público atual as criações de épocas passadas. Analisar a música sob a perspectiva histórica permite elaborar, por exemplo, estudos sobre acervos musicais que retratam uma época ou várias delas, contribuindo para a conservação de diversos materiais, desde instrumentos, discos e partituras até fotografias, livros e cartas. Ainda sob a perspectiva histórica, é possível esclarecer como se dava a relação da música com a sociedade em outros séculos e como ela se inseria sociológica e filosoficamente. Outro aspecto interessante dessas pesquisas é trazer para o público mais jovem, sejam estudantes de música ou apenas ouvintes, a oportunidade de conhecer como era a criação musical em outros tempos, qual era a dinâmica dos profissionais e do mercado, entre artistas e público, quais eram as características presentes nos instrumentos antigos em contraponto aos mais modernos, suas similaridades e diferenças, dentre outros aspectos da atividade musical.

Parte importante desse processo é documentar essa diversidade de registros nas páginas dos livros. Há muitas obras que falam de música sob diferentes perspectivas: biografias, estudos de estilos e movimentos artístico-musicais, coletâneas fotográficas etc. Porém, menos conhecidos junto ao grande público são os livros acadêmicos especializados. Esses, são frutos de pesquisas minuciosas, feitas por profissionais que se debruçam sobre as mais diversas características do campo musical.

Voltando aos samples citados no início do texto, o trabalho realizado pelo pesquisador Michel Brasil documentou a cultura de sampling no movimento rap de Belo Horizonte. O resultado é a obra Geração Boom Bap: sampling e produção musical de rap em Belo Horizonte, lançada pela Editora UEMG em 2022.

Também estão entre as publicações da Editora as obras Música de Museu: repensando um acervo, de Aline Azevedo, e A música dos séculos 20 e 21, organizada por Guilherme Nascimento, José Antônio Baeta Zille e Roger Canesso, integrante da série Diálogos com o Som. A primeira, retrata o trabalho realizado no Núcleo de Acervos da Escola de Música da UEMG por meio do patrimônio material e imaterial existente, de forma a estabelecer uma relação entre musicologia e museologia. A segunda obra trata da música e suas conexões nos séculos 20 e 21, trazendo análises que visam estimular o surgimento de novas reflexões e abordagens. Todos esses trabalhos estão disponíveis para download gratuito no catálogo da Editora UEMG, vale destacar.

Diante de tudo o que foi dito até aqui, podemos perceber como é rica e necessária a prática de criar releituras e, principalmente, documentar as diversas manifestações ligadas ao campo da música. São trabalhos que retomam o passado e, através disso, apontam direções para o futuro dessa arte tão diversa.

 

*Sofia Santos é designer formada pela Escola de Design da UEMG, com pós-graduação em Comunicação Estratégica pela PUC-Minas. Servidora efetiva da Universidade, atuou por vários anos na Assessoria de Comunicação e atualmente trabalha na Editora UEMG.

 

blog rodape

© 2024 UEMG - Todos os direitos reservados