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A pressão estética e a identidade feminina em A Substância e em Ser mulher no século XXI

Por Caroliny Procopio Lima*

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O corpo feminino sempre foi alvo de regulação, transformação e vigilância, seja por meio da ciência, da medicina ou dos estereótipos sociais. O filme A Substância, de 2024, dirigido por Coralie Fargeat, traz uma abordagem visceral sobre essas questões, expondo a relação de poder e controle sobre os corpos femininos em uma sociedade obcecada pela perfeição estética.

Em A Substância, acompanhamos Elisabeth, uma personagem que, ao aderir a um tratamento estético revolucionário, acaba perdendo sua própria identidade. O filme propõe uma crítica intensa à obsessão pela beleza e à forma como a sociedade impõe esses padrões irreais ao corpo feminino. O body horror explorado na narrativa evidencia o impacto psicológico e físico que essa busca incessante pela perfeição pode causar à mulher.

A ideia de controle sobre o corpo da mulher aparece no filme como uma força opressora e destrutiva, em que a protagonista se vê prisioneira de um sistema que a desumaniza, ilustrando como a indústria da beleza e a pressão social podem corroer a identidade individual.

A narrativa de Fargeat não apenas denuncia essa opressão como também apresenta a violência física e psicológica que dela decorre. Ao longo do filme, vemos o corpo da protagonista ser modificado, explorado e punido de formas que remetem a práticas históricas de subjugação feminina. O terror corporal se torna uma metáfora poderosa para a alienação e os perigos de se submeter a padrões inatingíveis.

Esse tema encontra eco em Ser mulher no século XXI: desafios, direitos, conquistas e vivências, obra publicada pela Editora UEMG que aborda as diferentes facetas da mulher perante a sociedade, reconhecendo as tensões, as demandas e as novas configurações que se apresentam para pensar o “ser mulher”. No livro, organizado por Daniela Oliveira R. dos Passos, Ana Paula Andrade e Rayane Silva Guedes, encontramos estudos e depoimentos que abordam essas diversas formas de violência contra a mulher e a necessidade de resistência, destacando como a relação entre raça, classe e sexualidade influenciam a experiência de ser mulher na sociedade contemporânea.

Assim, a obra amplia a discussão quando são analisadas as diversas formas de controle exercidas sobre o corpo feminino, que vão desde a imposição de padrões estéticos até a regulação da sexualidade e da reprodução. Em um de seus capítulos, o livro evidencia como a medicalização do corpo da mulher historicamente reforçou práticas de dominação, seja por meio da limitação do acesso a métodos contraceptivos, da patologização de processos naturais – como a menopausa e a menstruação – ou da ênfase excessiva em intervenções cirúrgicas e estéticas (Passos; Andrade; Guedes, 2023).

Além disso, a obra problematiza a forma como a raça, classe e contexto sociocultural influenciam esse controle, tornando a experiência da vigilância e da disciplina corporal ainda mais intensa para mulheres pretas, periféricas e trans (Passos; Andrade; Guedes, 2023). Essas reflexões ajudam a compreender como o corpo da mulher se tornou um campo de disputa, em que discursos médicos, religiosos e midiáticos moldam nossa percepção de nós mesmas, criando um ciclo de alienação e sofrimento e, ao trazer essa análise, o livro contribui para o debate sobre a necessidade de romper com essas estruturas e reafirmar a autonomia feminina em todas as suas dimensões.

Ao propormos um diálogo entre A Substância e Ser mulher no século XXI: desafios, direitos, conquistas e vivências, percebemos como o cinema e a literatura podem se complementar na crítica à violência sobre o corpo feminino e às dinâmicas de controle. Ambas as obras reforçam a necessidade de questionar essas imposições e de construir um futuro onde a identidade e a autonomia das mulheres sejam plenamente respeitadas. O livro pode ser acessado, gratuitamente, através do link: bit.ly/ser-mulher-no-seculo-XXI.

 

Referências

A SUBSTÂNCIA. Direção: Coralie Fargeat. Produção: Coralie Fargeat, Tim Bevan e Eric Fellner. Intérpretes: Demi Moore, Margaret Qualley, Dennis Quaid. Roteiro: Coralie Fargeat. Estados Unidos, Reino Unido, França: Working Title Films; A Good Story, 2024 (140 min).

PASSOS, Daniela Oliveira R. dos; ANDRADE, Ana Paula; GUEDES, Rayane Silva (org.). Ser mulher no século XXI: desafios, direitos, conquistas e vivências. 1. ed. Belo Horizonte: Editora UEMG, 2023.

 

* Caroliny Procopio Lima é estudante de Letras, com dupla habilitação em Português e Francês, na Universidade Federal de Minas Gerais desde 2021.

 

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